"No mundo da luz não existe lugar para o cativeiro da alma." M.V.B.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

PROMETEU E A CRIAÇÃO DO HOMEM

"... Prometeu aproximou-se do ser inerte que jazia no chão, esperando o sopro que lhe daria a vida. Parou e fechou os olhos.
— Rainha dos bosques sagrados — balbuciou tremulamente — eis-me aqui, novamente suplicando seu auxílio. Ilumine meu coração e minha mente, para que eu seja capaz, neste momento sagrado e único, de dar a vida a esta criatura. Seja ele o senhor de toda a criação física.
Calou-se. Logo em seguida começou a sentir um calor que chegava, que ocupava seu corpo e sua mente, que o incitava a mover-se em direção à pedra côncava que brilhava, cheia do fogo sagrado. Pegou a pedra e e chegou bem perto da criatura.
— Ser que dorme seu sono eterno e incriado, eis-me pronto a dar-lhe o sopro da vida.
Prometeu percebeu vagamente que não era mais ele quem falava. A presença da Alseide em seu interior era tão forte que não deixava nenhuma dúvida possível. Continuou:
— Que o grande Espírito permita que seja ele um depositário do fogo sagrado.
Num movimento suave, deixou verter sobre a criatura o fogo que brilhava na concavidade da pedra. Viu que ele escorreu pelo corpo inerte, percorrendo canais sutis em sua estrutura. Por fim, dividiu-se em duas partes. Uma delas colocou-se na base da coluna e a outra no coração. Uma força impulsiva fez com que Prometeu chegasse seu rosto ao rosto daquele ser que criara. Sua boca parou muito perto daqueles lábios ainda adormecidos e ele falou num sussurrou:
— Eu lhe insuflo o sopro divino.
Colou sua boca à da criatura e soprou com brandura. Imediatamente percebeu um ligeiro suspiro brotar dos lábios sob os seus. Afastou-se e observou.
O ser respirava levemente. Pouco depois a respiração tornou-se mais forte, e ele abriu os olhos.
Prometeu levantou-se, admirado. Olhou sua criatura que despertava do sono eterno para a vida física. E sorriu, gratificado.
Viu que o ser, agora vivo, estendia-lhe uma das mãos, como que pedindo auxílio. Segurou aqueles dedos quente e macios e ajudou-o a erguer-se. E ali estava, à sua frente, sua própria criação!
Com a mão direita, tocou-lhe o centro da fronte.
— Você agora faz parte do mundo criado, você existe e, como ser vivente, será responsável pela manutenção do mundo de Gea. Você é divino e humano. Você é o Homem.
O Homem sorriu e olhou em volta, surpreso com tudo que o rodeava. Depois deu um passo, e mais outro. Lentamente, aproximou-se da entrada da gruta. Parou e olhou o céu estrelado. Deixou que seus olhos se perdessem na imensidão. E, pela primeira vez, o Homem teve saudade. Saudade da origem, saudade de algum lugar que não sabia onde ficava, talvez saudade do calor do fogo, cuja parcela ínfima trazia em seu corpo, ou talvez saudade da inconsciência que deixara e que o aproximava tanto do Todo.
E, pela primeira vez, o Homem chorou."

Trecho do livro "Olimpo, a Saga dos Deuses", de Márcia Villas-Bôas



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